segunda-feira, 5 de fevereiro de 2007

O longo adeus ao petróleo

O petróleo ainda continua sendo a mais importante matéria-prima para gerar eletricidade, calor e combustível. Mas seus recursos são limitados. Isto exige que se pense sobre alternativas. Biodiesel ou células combustíveis: que matéria e que técnica poderá substituir o petróleo? E, sobretudo, quando?

Quando René Günther, chofer de táxi de Altlandsberg, perto de Berlim, abastece seu carro, ele não vai para o próximo posto de gasolina, mas compra seu combustível numa lanchonete: um grande galão de azeite que se usou para fritar. Em casa, ele filtra o azeite e enche o tanque do seu Mercedes C 220 Diesel com este líquido marrom. E puro! É um tanto trabalhoso conseguir o azeite usado, mas ele abastece o carro quase de graça.

Azeite de fritura como alternativa de combustível? Mesmo se calculando com grande margem, nem mesmo todo o azeite de cozinha da Alemanha bastaria para substituir 1% do diesel convencional. Em 2004, o consumo de diesel foi de 32 bilhões de litros. Todavia, o uso do azeite atinge o ponto nevrálgico do momento, pois não são só os motoristas que se perguntam o que acontecerá quando o petróleo e, com ele, a gasolina e o diesel não existirem mais.

O preço do petróleo caiu um pouco desde o seu recorde de 70 dólares o barril, em fins de agosto de 2005, mas ele continua sendo duas vezes mais caro que há dois anos. E não se pode prever uma queda de preço. “Já se foram os tempos do preço baixo do petróleo”, dizem os peritos. Ao mesmo tempo, cada vez mais geólogos acreditam que a extração do petróleo dentro em breve “cairá inexoravelmente”, como profetiza o inglês Colin Campbell. Ele esteve muito tempo a serviço da indústria petrolífera, antes de fundar uma associação global para pesquisa das reservas de petróleo.

Tempos ameaçadores, pois, para completar a desgraça, a queima do petróleo é uma das causas principais do aquecimento da Terra e, conseqüentemente, responsável por furacões, pela elevação do nível do mar, por secas no sul da Europa e em outros lugares.

Os especialistas já estão aplaudindo o “ouro verde”, o combustível do campo que cresce permanentemente. Ou apostam no hidrogênio, a fonte de energia teoricamente existente em grande quantidade, além de ser inócua. Mas tudo isto são promessas para o futuro. O primeiro passo é o uso eficiente da energia – especialmente para os motoristas, dizem analistas do Deutsche Bank e os especialistas reunidos no Conselho de Peritos Ambientais.

De fato, o grupo mais atingido por este cenário são os milhões de motorizados. De mais de 114 milhões de toneladas de produtos de petróleo, produzidos no ano passado nas refinarias alemãs, quase a metade foi destinada aos tanques dos veículos. O segundo na lista – óleo leve para calefação – aquece cerca de um terço das casas alemãs. Mas, enquanto já se pode construir que permaneçam quentes sem calefação, o trânsito das ruas – 55 milhões de carros, utilitários, caminhões, ônibus e motocicletas – fica paralisado sem gasolina e diesel.

Apenas 35000 veículos funcionam, até hoje, com combustão a gás. E a combustão orgânica substituiu, até agora, apenas 2% da demanda de gasolina e diesel. Mas quanto mais o fim da era do petróleo se aproxima, tanto mais lutam os motoristas por alternativas. Oficinas, que adaptam os carros para o uso de azeite vegetal, estão lucrando muito. Kai Lorenz, da firma de conversão Unicar, de Aachen, recebe cerca de 50 pedidos diários de conversão de motores para o uso de biodiesel. Custo por carro: mais de 2000 euros.

Não importa se se trata de colza, trigo ou beterraba: a imaginação dos fabricantes de combustível é ilimitada. Iogen, firma canadense de biotecnologia de ponta, faz experimentos com palha: enzimas especialmente cultivadas transformam suas hastes num substitutivo de gasolina. O conglomerado petrolífero Shell já tem participação na Iogen. Até mesmo de copinhos de yogurte descartados se fabrica diesel: a empresa EOS System, da Coréia do Sul, está procurando parceiros para produzir, também na Alemanha, este combustível alternativo.

Cair fora do petróleo? Nada é impossível. De fato, um grupo de peritos, encarregado pelo governo alemão, descobriu que existem “cerca de 270 opções de fabricação de combustível”. Por decisão da UE, quase 6% do combustível vendido em toda a Europa deverá, até 2010, vir do campo. A Alemanha já se tornou campeã mundial de produção de biodiesel, mas também este desenvolvimento chega aos seus limites. Segundo o Ministério das Finanças, a produção alemã de colza não pode cobrir mais de 3,7% da demanda de combustível na Alemanha.

Da beterraba ou da batata também é possível produzir o bioetanol, ou seja, aguardente: os chamados Flexible-Fuel-Vehicles (FFV) podem usar esse líquido com grande teor alcoólico, e até mesmo puro. Mas os custos de produção de etanol ainda são tão altos que não vale a pena produzir. Mesmo a importação barata do etanol brasileiro, feito de cana-de-açúcar, não levaria ao sucesso dessa alternativa para o petróleo.

Portanto, todas as esperanças estão depositadas na segunda geração de combustível renovável, o BTL (Biomass To Liquid), extraído não apenas de frutos, mas também de plantas inteiras: da raiz até à última folha, elas são inicialmente gaseificadas e, em seguida, sintetizadas como combustível líquido, num processo muito complicado. Mas o rendimento energético é grande, e o combustível fabricado é de alta qualidade.

À espera do “Sunfuel”

Sob a marca registrada “SunDiesel”, a empresa Choren Industries, da Saxônia, já vem fabricando este produto em fase experimental. A Mercedes e a VW já o testaram com sucesso. Já que a composição química do combustível sintético pode ser adaptada com exatidão às exigências dos futuros motores, híbridos para motores a diesel e a gasolina, os fabricantes de motores já se entusiasmam com o que chamam de “combustível de designer”. Além disso, não sairá do escapamento quase nenhum CO2 a mais do que as plantas de produção do combustível retiraram antes da atmosfera da Terra.

As empresas petrolíferas também já descobriram o “Sunfuel”. A Shell já tem participação na Choren. As concorrentes Total, BP e outras estão tão interessadas no material que querem agora pesquisar a fundo a técnica BTL, juntamente com a Agência Alemã de Energia (Dena), fabricantes de instalações e empresas automobilísticas. Em meados de 2006, os resultados deverão ser conhecidos. Quanto ao preço, o combustível BTL “oferecerá uma alternativa atraente”, já promete hoje Stephan Kohler, gerente da Dena. O potencial estaria “entre 20% e 25% de toda demanda de combustível”.

Apesar de tais prognósticos, outros também esperam poder abastecer a comunidade dos motoristas no futuro. Por exemplo, Werner Müller. O ex-ministro da Economia, e atual presidente do conglomerado energético RAG, de Essen, ao qual também pertence a Deutsche Steinkohle AG, fala de uma “importância cada vez maior” da liquefação do carvão, frente ao esgotamento iminente das reservas de petróleo e gás.

Transformar o carvão em petróleo já não é mais um problema para os engenheiros e técnicos, há quase 100 anos. Em 1913, o erudito alemão Fritz Bergius descobriu um processo que lhe valeu depois o Prêmio Nobel. Cerca de dez anos mais tarde, foi desenvolvida uma segunda técnica no Instituto Kaiser Wilhelm de Pesquisa do Carvão, em Mülheim an der Ruhr. Hoje, o método se tornou novamente competitivo. Para isso, o carvão alemão continua sendo muito caro, mas na China, por exemplo, a primeira usina moderna de liquefação de carvão deverá ser posta em funcionamento já em 2007.

Peritos em meio ambiente e energia atenuam as esperanças de se produzir gasolina do carvão, por causa do enorme impacto ambiental. Mas eles também admitem que, em curto prazo, nenhum outro substitutivo do petróleo tem uma chance real, exceto talvez o gás natural. Carros movidos a gás natural são mais caros do que carros a diesel ou gasolina, mas como o gás natural está isento do imposto sobre óleo mineral na Alemanha, até o ano de 2020, os consumidores tiram proveito dos custos operacionais mais baixos. “Em comparação à gasolina super, a despesa cai para a metade”, diz Christian Jacobs, porta-voz do Trägerkreise Erdgasfahrzeuge, círculo criado pelos fornecedores de gás e os fabricantes de automóveis.

As reservas de gás acumuladas na crosta terrestre vão durar um pouco mais do que as reservas de petróleo. Além disso, a combustão de gás é menos prejudicial ao meio ambiente do que os combustíveis tradicionais. Suas moléculas têm menos átomos de carbono e mais átomos de hidrogênio. O hidrogênio é considerado a energia inócua por excelência. Portanto, o gás natural é uma ponte para a era do hidrogênio. Certo é que a combustão do hidrogênio é completa, não deixando resíduos e, além de tudo, ele é encontrado em todo o universo, em quantidade quase ilimitada: na água. “Há um meio em vista para combater o preço da gasolina” – esta foi, portanto, a mensagem da primeira conferência mundial do hidrogênio, em Munique, há cinco anos.

É claro que a partida para o reino do hidrogênio inócuo e abundante continua sendo, até agora, apenas uma linda idéia. Em nenhuma feira do automóvel há um carro a hidrogênio e existem pouquíssimos postos de hidrogênio. “A energia precisa de tempo… mais de dezenas de anos do que só de anos”, afirma Carl-Jochen Winter, apelando para a paciência. Winter, professor aposentado de Tecnologia Energética, é considerado o “papa do hidrogênio” na Alemanha. A matéria explosiva poderá mover carros com motores de combustão modificados – um projeto, no qual a BMW vem apostando – ou servirá de fonte de energia para veículos elétricos, idéia preferida pela maioria dos fabricantes de carros. Para isto, células combustíveis deverão transformar o hidrogênio em eletricidade. A Mercedes-Benz já está testando 27 ônibus urbanos de células combustíveis em sete cidades européias e espera assim conseguir informações valiosas para o futuro automobilístico.

Mas também o hidrogênio tem, primeiramente, que ser produzido. E custa muitíssima eletricidade a extração das moléculas de hidrogênio da água. Por isso, os peritos calculam que, no ano de 2020, o hidrogênio cobrirá apenas 2%, na melhor das hipóteses 5%, da demanda no mercado de combustíveis. Já que as outras alternativas ainda não estão desenvolhvidas, são caras ou escassas demais, os veículos ainda continuarão sendo movidos, por tempo indeterminado, com os combustíveis conhecidos derivados do petróleo.

Mas talvez com uma quantidade muito menor. Pois os motores clássicos ainda guardam enormes potenciais de eficiência, através por exemplo da redução de cilindragem – nome moderno, Downsizing – e através de transmissão melhorada. Os motores de ignição expontânea poderiam economizar quase um terço, segundo um recente relatório do Conselho de Peritos em Questões Ambientais. Os peritos confiam em que veículos com motor a combustão possam economizar até mesmo 38%.
Fonte: Magazine Deutschland
Fritz Vorholz

Deutschland magazine www.magazine-deutschland.de

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